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Diálogo construtivo busca reintegração de adolescentes em conflito com a lei em Salvador
24 DE OUTUBRO DE 2022
Um espaço para o jovem em conflito com a lei se expressar, refletir, compreender o contexto em que está inserido e, assim, encontrar alternativas que possibilitem a construção de novos caminhos. Essa é a proposta do projeto Lugar de Fala, implementado pela Defensoria Pública da Bahia em 2019. A iniciativa se diferencia pela promoção de palestras, debates, oficinas de produção literária e cursos de profissionalização para jovens de Salvador que cumprem medidas socioeducativas.
De acordo com o defensor público Bruno Moura de Castro, idealizador da ação, o objetivo é colocar o adolescente que passa por medida de internação como protagonista do processo. “Para que isso aconteça, necessariamente, a gente tem de estabelecer ou garantir lugar de escuta do adolescente inserido nesse processo. O projeto busca não apenas ensinar, mas também escutar o que eles têm para transmitir”, explica.
Castro enfatiza que a iniciativa estabelece tratamento horizontal com os participantes para a construção de uma relação transparente e transformadora de todo o processo socioeducativo. Ele observa que, por esse caminho, são alcançados resultados positivos em relação, por exemplo, à relação conflituosa desses jovens nas unidades em que se encontram. “Conseguimos distensionar, pelo diálogo, as relações que acontecem fora do espaço do projeto”.
Profissionais de diversas áreas participam do diálogo com os adolescentes, incluindo defensores públicos, professores universitários, psicólogos e sociólogos. Desde o início, o projeto reúne diferentes atores da sociedade que abordam temas distintos, mas que fazem parte da realidade desses jovens, como racismo, violência contra mulher e violência urbana.
“Apresentamos os temas para debate, que normalmente são questões que eles vivenciam, mas nunca discutiram”. De acordo com o defensor, quando as questões são trabalhadas, os participantes acabam se envolvendo nas conversas e passam a elaborar melhor a realidade em que estão inseridos. “É possível perceber, no decorrer dos diálogos, um certo despertar de consciência sobre temas que eles vivenciam no cotidiano”.
O Lugar de Fala, garante Castro, contribui para os adolescentes perceberem a violência que, muitas vezes, foram vítimas, bem como a violência em que foram autores. “Promover essas reflexões é fundamental para o próprio amadurecimento deles. E essa é outra questão que não podemos perder de vista: estamos lidando com adolescentes, pessoas ainda em formação e que estão construindo as próprias identidades e caráter”, pondera.
Conforme o defensor público, os atos infracionais cometidos pelos adolescentes que cumprem medidas socioeducativas que geram internação na Bahia envolvem, na maior parte dos casos, questões patrimoniais, como roubo e furto. Segundo ele, uma parcela pequena está relacionada a crimes contra a vida ou latrocínio. “O perfil desses garotos é de adolescente em situação de vulnerabilidade. Estão fora do ensino formal e inseridos em famílias com questões mal resolvidas.”
O idealizador da iniciativa enfatiza que a ausência do pai é muito comum na vida desses jovens. “A maioria deles já trabalha desde muito cedo em atividades que não são adequadas à condição e idade deles. Muitos assumem responsabilidades de adulto desde muito cedo, resultado de uma situação imposta pela própria condição de vulnerabilidade a que estão submetidos”, explica.
Vencedor da segunda edição do Prêmio Prioridade Absoluta na Categoria Sistema de Justiça – Eixo Infracional, o Lugar de Fala já atendeu 70 adolescentes com idade entre 12 e 21 anos, oriundos das Comunidades de Atendimento Socioeducativa (CASEs) feminina e masculina. Instituída pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a premiação reconhece iniciativas e projetos desenvolvidos pela sociedade civil organizada e do poder público voltados para a valorização e respeito aos direitos de crianças e jovens.
Além de reconhecer iniciativas sintonizadas com a Constituição Federal, Estatuto da Criança e do Adolescente e com o Marco Legal da Primeira Infância, que determinam que crianças e os adolescentes sejam tratados como prioridade absoluta, o Prêmio Prioridade Absoluta também contribui para a disseminação e estímulo para que boas práticas sejam replicadas. Os projetos e programas premiados também passarão a integrar o Banco de Boas Práticas que se encontra em fase de criação no CNJ.
Profissionalização
Juntamente com as palestras, diálogos, debates e oficinas de produção artística, o Lugar de Fala também investe na profissionalização dos participantes. Por meio de parcerias com a Fundação da Criança e Adolescente da Bahia (Fundac), a Defensoria Púbica da Bahia oferece cursos de qualificação para promover a inserção no mercado de trabalho.
Castro enfatiza que existe uma grande dificuldade para inseri-los no mercado de trabalho e a Defensoria Pública busca parcerias com outras instituições, como o Ministério Público do Trabalho (MPT) e empresas. O objetivo é encaminhá-los para empregos mais estáveis. Bruno Moura de Castro conta que um dos desdobramentos do projeto foi viabilizar que muitos participantes fizessem estágios na própria Defensoria Pública.
A possibilidade de monitorar os atendidos pelo programa, inclusive após o cumprimento das medidas socioeducativas, foi outro fator que motivou o desenvolvimento do Lugar de Fala. De acordo com Castro, é importante acompanhá-los e verificar como está a vida após o cumprimento das medidas, a fim de evitar reincidência, bem como para buscar oportunidades no mercado de trabalho ou em outros cursos profissionalizantes.
Reconhecimento
A conquista do Prêmio Prioridade Absoluta do CNJ, na avaliação do defensor público, é incentivo importante para o fortalecimento do projeto. Segundo ele, o reconhecimento contribui para a sedimentação do Lugar de Fala na Defensoria Pública do Estado da Bahia. “É fundamental que a iniciativa se transforme em uma política pública da instituição e não fique reduzido um projeto de uma pessoa, de um defensor específico”.
O fortalecimento do Lugar de Fala também pode estimular outras iniciativas semelhantes e garantir que não fiquem restritas ao Sistema Socioeducativo, inclusive estimulando ações voltadas para o sistema penitenciário. “É extremamente importante atuar junto a essas pessoas com o foco voltado para a ressocialização. São iniciativas que podem contribuir para que – após o período no cárcere – elas voltem melhores ou, pelo menos, que não sejam piores do que quando chegaram”.
Texto: Jeferson Melo
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias
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