NOTÍCIAS
Avanço ou ‘inchaço’? O que levou o Brasil a bater recorde de registros de mudança de gênero
03 DE FEVEREIRO DE 2023
Entre 2021 e 2022, o Brasil registrou um aumento de 70% no volume de registros de mudança de nome e gênero em cartórios de registro civil. Em entrevista ao IBDFAM, especialistas avaliam dados recentemente divulgados pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais – Arpen-Brasil e refletem sobre o cenário atual brasileiro.
Segundo a Arpen-Brasil, entidade que reúne todos os 7.741 Cartórios de Registro Civil do Brasil, nos últimos dois anos o número de registros de mudança passou de 1.863 para 3.165. O número é recorde no país desde que a alteração passou a ser possível diretamente nos cartórios, em 2018.
Conforme os dados divulgados pela entidade, do total de atos realizados em 2022, 43% se referem a pessoas que mudaram seu gênero de feminino para masculino, enquanto 51,3% mudaram de masculino para feminino, uma proporção que vem-se mantendo ao longo dos anos. Já 5,7% mudaram o nome, mas ainda não realizaram ou estão em procedimento para mudar de sexo.
No mesmo período, o Estado de São Paulo registrou um aumento de 40% na alteração de gênero em documentos pessoais nos cartórios. De acordo com informações compiladas pela Arpen-SP, do total de procedimentos realizados em 2022, cerca de 45% envolveram alteração do gênero feminino para o masculino e de nome; 49%, do gênero masculino para o feminino, incluindo nome; e 6% optaram por fazer somente a mudança no registro do gênero, mantendo o mesmo nome.
“Alguns fatos podem ter influenciado incidentalmente esse aumento, como o arrefecimento da pandemia da Covid-19”, avalia Márcia Fidelis Lima, oficial de registro civil e presidente da Comissão Nacional de Notários e Registradores do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Segundo a especialista, a crise sanitária criou um gargalo entre 2020 e 2021, adiando os atos que deveriam ser requeridos nesse período, “tendo por consequência um certo alargamento dos números atuais”. Ela pondera, contudo, que o maior impacto veio da edição de normas.
Ela cita o Provimento 16/2022/CGJRS, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que dispensou a via judicial e autorizou a alteração da manifestação de gênero no registro para não binário, diretamente perante o registrador civil.
Inclusão social
Márcia Fidelis reconhece que a decisão do Supremo Tribunal Federal – STF no âmbito da ADI 4275 representou um grande marco para a garantia da dignidade da pessoa transgênero. O Tribunal entendeu pela constitucionalidade do requerimento de alteração do prenome e do sexo no registro da pessoa transgênero diretamente nos ofícios de registro civil.
Ela lembra, no entanto, que o Provimento 73/2018, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, de abrangência nacional, ateve-se a regulamentar essas alterações dentro da binaridade. “Ou seja, o campo ‘sexo’ no registro de nascimento pode ser alterado de ‘feminino’ para ‘masculino’ e vice-versa.”
Essa dicotomia, segundo a especialista, não alcança a realidade de grande parte dos transgêneros. “Tanto o sexo da pessoa, biologicamente falando, quanto a sua identidade de gênero são espectros e não uma dualidade.”
“Essa maior amplitude garante reconhecimento jurídico e inclusão social, direitos de todos os cidadãos e cidadãs no nosso país, já que retrata no registro a sua realidade identitária, que não se limita à dualidade homem/mulher”, frisa Márcia.
Abrangência nacional
A diretora nacional do IBDFAM acredita que uma regulamentação de abrangência nacional é necessária para garantir de forma efetiva o direito desta população na seara registral brasileira.
“Essa medida, além de atender a todo o público brasileiro, evitará variações nas regras a depender da Unidade Federativa. Urge o tratamento do assunto pela Corregedoria Nacional do Conselho Nacional de Justiça”, comenta Márcia Fidelis.
De acordo com a especialista, também “é imprescindível que se dê maior divulgação desse direito para que alcance a população mais distante dos grandes centros, mais alheias ao debate público e à informação de qualidade”.
Transfobia
A tabeliã de notas Carla Watanabe, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, vê o aumento de forma crítica. Para ela, o crescimento nada representa diante do número de pessoas que têm desejo de proceder à retificação, mas não o fazem devido à transfobia da estrutura e de alguns oficiais.
“Não é um crescimento. É um inchaço”, acredita Watanabe.
Em contrapartida, a professora e pesquisadora da CAPES, Sara Wagner York, aponta a existência de dois movimentos: “Um que expande o conceito de gênero desvinculado ao sexo, como várias correntes teóricas têm demonstrado; e um que é acionado pelo sujeito ao compreenderem que suas identidades e modos de estarem no mundo não cabem em conceitos fechados como tínhamos no século passado”.
“Roupas, brinquedos e coisas de meninos, já não são apenas deste grupo. Somos como a natureza, diversos, diferentes e múltiplos, ainda que pareçamos tão iguais, ainda somos únicos”, conclui a pesquisadora.
Fonte: IBDFAM
Outras Notícias
Portal CNJ
Juizado do Torcedor atuarão no Campeonato Pernambucano em Caruaru
04 de janeiro de 2023
O Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) publicou, por meio do Ato n. 08/2023, a escala dos plantões do Juizado...
Portal CNJ
Compras compartilhadas geram economia na Justiça Federal da 5ª Região
04 de janeiro de 2023
No segundo ano de adoção do modelo de compras compartilhadas, a Justiça Federal da 5ª Região (JF5) conseguiu...
Portal CNJ
Conciliar é Legal premiou boas práticas e produtividade de tribunais em 2022
04 de janeiro de 2023
A edição de 2022 do Prêmio Conciliar é Legal valorizou iniciativas de pessoas e instituições que se dedicam a...
Anoreg RS
Revista Crescer – Pelo menos 738 crianças peruanas têm nomes em homenagem a Pelé
04 de janeiro de 2023
Por incrível que pareça, homenagens desse tipo ao rei do futebol são mais comuns no Peru do que no próprio Brasil.
Anoreg RS
Artigo – 2023: A Gente se vê nos Cartórios
04 de janeiro de 2023
Com a chegada de 2023 é tempo de recomeçar, deixar para trás tudo aquilo que não faz mais sentido, e desenhar...